A vitivinicultura na região contribui para diversificar a produção de pequenos e médios agricultores, gera renda, favorece o turismo e tem atraído a atenção de empreendedores de outros estados do Nordeste
Seis variedades de uvas foram recomendadas especificamente para o agreste pernambucano, abrindo uma nova fronteira para vinhos finos.
O novo polo produtor foi impulsionado por pesquisas pioneiras da Embrapa Semiárido (PE), em parceria com a Universidade Federal do Agreste de Pernambuco (Ufape) e o Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), com base em dados que comprovam a viabilidade da produção local e análises que atestam a qualidade dos vinhos lá produzidos.
Patrícia Coelho de Souza Leão, pesquisadora da Embrapa e coordenadora do projeto, revela que o estudo envolveu o cultivo e avaliação de dez variedades de uvas europeias em cinco ciclos de produção, no campo experimental do IPA, no município de Brejão (PE).
Segundo ela, o objetivo foi compreender o comportamento agronômico, a adaptação das variedades, a qualidade das uvas, o potencial enológico e a viabilidade do processamento de vinhos em regiões não tradicionais.
Cultivares
A pesquisadora salienta que para a produção de vinhos brancos, as cultivares recomendadas foram Sauvignon Blanc, Muscat Blanc à Petits Grains (conhecido como Moscato Branco) e Viognier.
Ela completa que, para os vinhos tintos, as variedades mais indicadas foram Syrah, Cabernet Sauvignon e Malbec.
De acordo com informação da especialista, essas cultivares se destacaram pelo bom desempenho agronômico, produtividade e potencial enológico.
“A Sauvignon Blanc, Syrah e Malbec foram as mais notáveis, com produtividade média de 10 toneladas por hectare, similar à registrada na região do Vale do São Francisco, polo produtor já consolidado, sendo recomendadas para cultivo no Agreste”, detalha.
Além dessas, a Chardonnay foi avaliada para vinhos brancos, e a Pinot Noir e Petit Verdot para vinhos tintos.
“No entanto, essas variedades não mostraram boa adaptação, apresentando fraco desenvolvimento vegetativo, baixo vigor e produtividade reduzida”, aponta a pesquisadora.
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Qualidade dos vinhos
Patrícia revela, ainda, que o projeto também incluiu a avaliação da qualidade dos vinhos produzidos a partir das uvas cultivadas.
Ela sublinha que a vinificação foi realizada no Laboratório de Enologia da Embrapa Semiárido, utilizando métodos tradicionais em escala experimental.
“Os vinhos resultantes atenderam às exigências da legislação brasileira para vinhos finos secos e se destacaram em análises sensoriais conduzidas pela equipe da Escola do Vinho, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IF Sertão-PE).”
Segundo informação da especialista, essas análises confirmaram o potencial dos vinhos da região Agreste de Pernambuco.
Potencial do enoturismo
A pesquisadora da Embrapa e coordenadora do projeto frisa que o trabalho de pesquisa tem impulsionado o cultivo de uvas viníferas e a produção de vinhos de alta qualidade no Agreste, atraindo empreendedores interessados no potencial do enoturismo como uma nova oportunidade de negócio.
“Os resultados são um estímulo para a produção de uvas viníferas na região. Além de atrair o turismo, a vitivinicultura diversifica as atividades agropecuárias, especialmente para pequenos e médios empreendedores rurais, e oferece ao consumidor vinhos de qualidade diferenciada em relação aos produzidos no Semiárido”, sublinha.
Desempenho das uvas no Agreste pernambucano
- Muscat Blanc à Petits Grains
Apresentou ciclo produtivo de 129 dias e produtividade média de 6 toneladas por hectare, chegando a 8 toneladas em condições ideais.
Cada planta produziu, em média, 12 cachos, com massa em torno de 148 gramas, e rendimento de polpa de 74,39%.
O vinho branco seco dessa variedade destacou-se pela coloração esverdeada com reflexos dourados, aromas complexos de frutas tropicais, notas cítricas e florais, e um corpo leve com bom equilíbrio entre álcool e acidez.
- Sauvignon Blanc
O ciclo fenológico da Sauvignon Blanc durou em média 135 dias.
A produtividade média foi de 11 toneladas por hectare, com um máximo de 16 toneladas.
Cada planta produziu cerca de 23 cachos, com massa média de 109 gramas e rendimento de polpa de 70,37%.
O vinho dessa variedade se apresentou límpido e brilhante, com aromas de frutas brancas, tropicais e notas cítricas. Na boca, mostrou equilíbrio, corpo médio e boa persistência.
- Viognier
O ciclo de produção variou de 132 a 138 dias.
A produtividade média foi de 5 toneladas por hectare, podendo atingir 6 toneladas.
Cada planta produziu, em média, 12 cachos, com massa de 94 gramas.
O rendimento da polpa foi de 66,56%.
O vinho seco de Viognier apresentou coloração amarelo pálido, aroma complexo com notas de mel, baunilha, frutas cítricas e tropicais, e um sabor equilibrado com boa persistência.
- Syrah
Para a variedade, o ciclo fenológico foi de 144 dias, com uma brotação de 60,37% e produtividade de 10 toneladas por hectare, podendo chegar a 14 toneladas.
Os cachos apresentaram massa média de 110 gramas.
O rendimento de polpa foi de 61,73%.
O vinho tinto seco jovem apresentou coloração rubi, notas aromáticas de frutas vermelhas e especiarias, corpo médio e persistência gustativa.
- Cabernet Sauvignon
Apresentou ciclo de 149 dias, chegando a 160 dias.
A produtividade foi de 4 toneladas por hectare, com um máximo de 5 toneladas.
Cada planta produziu cerca de dez cachos com massa de 105 gramas.
O rendimento médio de polpa foi de 59,83%.
O vinho tinto seco jovem dessa cultivar apresentou coloração rubi com reflexos acastanhados, aromas de pimentão verde, especiarias, frutas vermelhas em compota, frutas negras e menta.
Na boca, é equilibrado, com corpo médio e sabor frutado, com persistência gustativa média.
- Malbec
O ciclo fenológico foi de 146 dias, com brotação média de 54,65%, alcançando produtividade de 10 toneladas por hectare, podendo chegar a 18 toneladas.
Os cachos apresentaram massa média de 140 gramas.
O vinho tinto seco jovem da variedade Malbec apresentou coloração rubi com reflexos violáceos, bom brilho e limpidez, aromas de frutas vermelhas e negras, notas florais e um sabor frutado com corpo leve.
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União entre pesquisa e empreendedorismo
Os trabalhos conduzidos pela Embrapa Semiárido forneceram a base para a ascensão de uma nova região vinícola no Agreste de Pernambuco, especialmente em Garanhuns, ao validar o cultivo de uvas em área de produtor local.
A iniciativa uniu pesquisa científica e empreendedorismo, revelando o potencial da vitivinicultura de altitude na região.
O empresário e médico Michel Moreira foi o primeiro a apostar nesse potencial. Proprietário da vinícola Vale das Colinas, ele produz anualmente cerca de 6 mil garrafas de vinho, que já conquistaram prêmios nacionais, tornando-se um exemplo de sucesso e inovação no Agreste.
A jornada de Leite começou em 2013, quando ele e sua esposa adquiriram um terreno de 37 hectares na zona rural de Garanhuns e decidiram transformar a área em uma plantação de uvas viníferas.
“Não sabíamos por onde começar, então, fomos à Embrapa buscar informações sobre a viabilidade técnica do projeto”, relembra.
Projeto piloto
No Centro de Pesquisa, o casal descobriu que já estavam sendo realizados experimentos com o cultivo de uvas viníferas no Agreste. Para eles, a Empresa foi crucial na construção do projeto piloto em Garanhuns.
O empresário, então, somou forças à instituição de pesquisa por meio de um convênio de cooperação técnica, disponibilizando seu parreiral para novos estudos. Dessa colaboração nasceu a Vale das Colinas, em 2018.
Leite relata que, inicialmente, foram plantadas as variedades Cabernet Sauvignon, Malbec e Muscat Petit Grain em 3,5 hectares.
“A primeira colheita, em 2020, deu início às atividades de enoturismo. A área cultivada foi ampliada para 14 hectares, com novas variedades, como Syrah, Chenin Blanc e Marselan”, conta.
O empresário ressalta que com foco na produção artesanal e na sustentabilidade, a Vale das Colinas se posiciona como uma Vinícola Boutique, privilegiando a colheita manual e promovendo visitas e eventos.
“Não queremos mecanizar, pois a geração de empregos é um compromisso nosso”, afirma.
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Rótulos
Atualmente, a vinícola oferece cinco rótulos, incluindo três tintos — Cabana do Vale Reserva (Cabernet Sauvignon), Dona Elisa (Malbec) e Cabana do Vale (Cabernet Sauvignon) — e dois brancos — Dona Cecília (Muscat Blanc à Petits Grains) e Ciranda (Sauvignon Blanc).
As primeiras safras foram vinificadas com apoio da Embrapa e do Instituto Federal do Sertão, em Petrolina. Desde a terceira safra, o processo de vinificação passou a ser feito na própria propriedade, com a última safra resultando em 19.500 garrafas.
Enoturismo
Agora, Leite busca reduzir custos e aumentar a competitividade do negócio. Ele acredita que a maior contribuição do projeto foi o impacto no desenvolvimento humano da região.
“Nossa vinícola fortaleceu a hotelaria e a gastronomia de Garanhuns, impulsionando o turismo local”, sublinha.
O crescimento da vitivinicultura no Agreste pernambucano atraiu novos empreendedores, como a Vinícola Mello, que iniciou suas operações em 2021, com variedades como Malbec, Merlot, Cabernet Franc, Chenin Blanc, Chardonnay e Pinot Noir.
Estudos de 12 novas variedades ampliam ainda mais o potencial vinícola da região.
Patrícia Souza Leão destaca que o sucesso do enoturismo no Agreste e no Semiárido pernambucanos tem atraído a atenção de empreendedores de outros municípios do Nordeste.
“Já estão em andamento projetos para a implantação de vinhedos em Camocim de São Félix, Bonito, Gravatá e Flores, em Pernambuco; e em Bananeiras, Natuba e Sousa, na Paraíba; além de São José de Mipibu, no Rio Grande do Norte”, conta.
Em sua avaliação, são as pesquisas da Embrapa e de parceiros que estão fortalecendo a vitivinicultura brasileira, gerando novas oportunidades de negócios e promovendo o desenvolvimento econômico no interior do Nordeste do País.
Condições climáticas
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Próximos passos
Patrícia enfatiza que o cultivo de videiras voltado à produção de vinhos finos no Agreste pernambucano está em fase de aprimoramento para estabelecer um sistema de produção mais eficiente e competitivo. “Esse é o próximo passo da pesquisa, no entanto, com base nos trabalhos já realizados, foram elaboradas recomendações para otimizar o cultivo na região”, explica.
A pesquisadora reforça a importância da continuidade dos estudos realizados pela Embrapa em parceria com outras instituições, como a Ufape e o IPA.
Em sua opinião, essas pesquisas abordam aspectos cruciais do sistema de produção, incluindo técnicas de manejo, avaliação de novas cultivares e clones, redução do ciclo produtivo, práticas de poda e definição do momento ideal para a colheita.
“O objetivo é tanto aumentar a produção quanto garantir uvas de maior qualidade para a elaboração de vinhos”, ressalta.
A especialista explica que a qualidade do vinho está diretamente relacionada ao manejo adequado das plantas.
“Portanto, o avanço dos estudos é essencial para melhorar a competitividade da cadeia produtiva na região. Isso contribuirá para diversificar a economia local, gerando novos empregos e renda”, conclui.