Para que ocorram as chuvas, é importante compreender que alguns fenômenos devem antecedê-las, dentre eles a saturação do ar atmosférico, possibilitando a condensação e a consequente precipitação de gotas
Ano após ano, o Brasil e o resto do mundo têm observado uma redução da ocorrência de precipitações das chuvas ou, quando ocorrem, são concentradas e de maior intensidade. Em ambas as situações é evidente que a disponibilidade hídrica tem diminuído, conforme alerta o engenheiro agrônomo Antônio Pasqualetto, professor doutor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) e do Instituto Federal de Goiás (IFG).
Para que ocorram as chuvas, diz o especialista, é importante compreender que alguns fenômenos devem antecedê-las, dentre eles a saturação do ar atmosférico, possibilitando a condensação e a consequente precipitação de gotas.
Segundo Pasqualetto, o índice mais conhecido para descrever o conteúdo de vapor d’água é a umidade relativa, que envolve um indicador da possibilidade de ocorrência de chuva.
“Em bons níveis, ela é um indicador de qualidade de vida, visto que favorece inúmeros processos metabólicos e de bem-estar da população. Se o conteúdo de vapor d’água permanecer constante, o decréscimo na temperatura aumentará a umidade relativa e o aumento na temperatura causa diminuição na umidade relativa”, explica o engenheiro.
Isso tudo porque o ar quente se expande e aumenta a capacidade de reter umidade. “Ao contrário, o ar frio se comprime, saturando-se mais facilmente. Nesse ultimo caso, o funcionamento de um ar condicionado, ao resfriar o ar retirado do ambiente, libera água retida do ar mais quente.”
No Estado de Goiás, a precipitação média anual varia entre 1,5 mil a 1,6 milímetros e estão concentrados, principalmente, entre os meses de outubro e março, ou seja, há somente duas estações bem definidas: uma de seca e outra de chuvas.
Goiás é um dos maiores produtores de grãos do Brasil, que inclui soja e milho. É o primeiro na produção de sorgo e tomate do País, e o segundo de algodão, atrás somente de São Paulo, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
De onde vêm as chuvas
De acordo com Pasqualetto, as chuvas que ocorrem em Goiás, por exemplo, têm duas origens principais: aquela que é proveniente das frentes frias oriundas do Sul do Brasil, especialmente do Polo Sul; e as que chegam pelas massas de ar úmidas da Amazônia.
“As frentes frias e úmidas provenientes do Polo Sul, com força para alcançar a região central do Brasil, resultam em precipitação no Estado de Goiás.”
Da mesma forma, continua o professor, “as massas de ar provenientes do Norte do País chegam a Goiás com umidade e temperatura elevadas, bastando apenas, encontrarem uma condição local de menor temperatura para o ar se comprimir e liberar as gotas de chuva.
Solo e vegetação
O solo e vegetação complementam esse ciclo hidrológico, garantindo infiltração e os processos de evaporação (solo) e transpiração (plantas), ou seja, a evapotranspiração. “Será tanto maior e mais frequentes as precipitações, quanto maiores forem os processos de infiltração e evapotranspiração”, salienta o professor.
Ele explica que, com o solo impermeabilizado e a ausência de vegetação, as gotas da chuva, quando ocorrem, rapidamente são drenadas aos córregos e, em até 15 dias, atingem os pontos mais baixos – os oceanos.
“Sem água infiltrada e sem vegetação, dificultam-se os processos de evapotranspiração, não reestabelecendo a umidade relativa do ar necessária para futuras precipitações.”
Fator bloqueador
Conforme Pasqualetto, um fator bloqueador é a massa de ar quente que permanece sobre o Estado de Goiás e a parte central do País, impedindo a chegada de frentes frias e úmidas provenientes do Sul, bloqueando-as na Região Sudeste e ocasionando chuvas torrenciais e de elevada intensidade. Posteriormente, elas se deslocam para o Oceano Atlântico.
“Da mesma forma, quando o ar está aquecido, ele se expande aumentando a capacidade de reter umidade. Entretanto, sem a umidade presente, não ocorre a saturação.”
Para piorar a umidade que viria da Amazônia, “não mais chega à intensidade esperada, especialmente em função dos desmatamentos e alterações de uso e ocupação do solo na Região Norte do País”.
“Nesse caso, o ar demora muito a se saturar e, quando ocorre, a tendência é precipitação torrencial, intensa em curto espaço de tempo. A demora na saturação do ar pela falta de umidade também conduz a chuvas ocasionais, de menor frequência temporal.”
Como mitigar o problema
Na opinião do engenheiro agrônomo, “fatalmente, a tendência futura nos reserva escassez hídrica, simplesmente por fatores como o crescimento populacional e maior demanda para as atividades produtivas”. “Entretanto, não são apenas esses fatores que determinam a disponibilidade de água. Ressaltamos os constantes processos de degradação ambiental e o comprometimento da qualidade da água, que afeta sua disponibilidade”.
Ele acrescenta a isso o constante desmatamento, a retirada da mata ciliar e o comprometimento das nascentes e impermeabilização do solo.
Diante desses fenômenos, Pasqualetto aponta algumas soluções:
– Aplicar os instrumentos da política nacional de recursos hídricos: plano de recursos hídricos, outorga de água, cobrança dos recursos hídricos, enquadramento dos corpos hídricos e sistema de informações;
– Fiscalização e monitoramento dos recursos hídricos;
– Manutenção da mata ciliar, área de preservação permanente, e da reserva legal;
– Propagação de programas como produtor de água;
– Pagamento por serviços ambientais prestados pela natureza;
– Incentivo à construção de barragens de água;
– Implantação de bacias de retenção e infiltração de água;
– Adoção de práticas de infiltração de água no solo;
– Educação ambiental para uso racional da água.
“Muitas podem ser as ações voltadas para a melhoria da qualidade e quantidade de recursos hídricos disponíveis. No entanto, em situações de crises hídricas, não basta somente orar, rezar para São Pedro, pedindo que nos envie água. Mas é importante recordar os ensinamentos de São Francisco de Assis, que a prática de preservação é mais eficiente e barata que a necessidade de remediação”, analisa Pasqualetto.