Patógenos têm progressão acelerada e podem ocasionar o óbito do animal (Foto: Divulgação)
O confinamento do gado de corte é uma atividade crescente no Brasil e tem, como principal objetivo, aumentar a eficiência da cadeia produtora de carne bovina no país, através de um sistema de criação onde é possível superar adversidades sazonais e que permite maior velocidade no processo de produção.
Um dos desafios mais importantes do confinamento é a maior probabilidade de transmissão de patógenos pela concentração de animais de origens distintas, podendo acarretar doenças graves, uma vez que o estresse do transporte, adaptação ao novo ambiente, estabelecimento de hierarquias, além da mudança na dieta podem impactar a imunidade dos bovinos.
Este último fato também pode alterar o ambiente gastrointestinal e favorecer a multiplicação de clostrídios patogênicos, o que leva a produção de toxinas (venenos) que poderão estimular a doença clínica nos animais com altos índices de mortalidades.
Dentre as enfermidades que acometem o gado confinado, a DRB (Doença Respiratória Bovina) e as Clostridioses são as que mais geram preocupação aos produtores, sendo responsáveis por 30,5% e 13,1% das causas de óbito dos animais, respectivamente, segundo dados da Foco Consultoria. Com relação a DRB a taxa de letalidade (proporção de animais mortos em relação aos animais que adoecem) é alta, ultrapassando 50% em alguns casos.

Dentre as enfermidades que acometem o gado confinado, a DRB (Doença Respiratória Bovina) e as Clostridioses são as que mais geram preocupação aos produtores. Foto: Divulgação
Doença Respiratória Bovina
Situações que promovem o estresse dos animais como a formação de novos lotes, transportes por longas distâncias, restrição de água e comida, a mistura de animais de origens diversas e a acidose metabólica são fatores que predispõem à DRB. O excesso de poeira e a formação de gases tóxicos (amônia) produzidos pelo acúmulo de material orgânico (urina, fezes e alimentos) e umidade, promovem a irritação das vias aéreas superiores dos bovinos, favorecendo a queda da imunidade local e a ocorrência da doença.
Conforme explica o médico-veterinário e gerente de serviços veterinários para bovinos da Ceva Saúde Animal, Marcos Malacco, a DRB é uma doença multifatorial que normalmente acontece por um desequilíbrio nas defesas naturais nas vias respiratórias superiores dos bovinos, algo que favorece a proliferação de agentes infecciosos oportunistas, principalmente bactérias que habitam naturalmente estes locais no trato respiratório. “A proliferação bacteriana e a migração destes agentes para os pulmões promovem um quadro inflamatório local, que é agravado com a produção de toxinas”, detalha.
Segundo o especialista, nos confinamentos onde há casos de DRB, o ganho de peso médio diário (GMD) dos animais afetados e que não vão à óbito é severamente comprometido, obrigando um maior tempo para o alcance do peso desejado para o abate e reduzindo o rendimento e a qualidade das carcaças. O período de maior incidência de surtos de DRB nos confinamentos de bovinos de corte correspondem aos primeiros 45 dias de confinamento do gado, especialmente nas 2 ou 3 primeiras semanas.

O período de maior incidência de surtos de DRB nos confinamentos de bovinos de corte correspondem aos primeiros 45 dias de confinamento do gado. Foto: Divulgação
“Durante esse período, é recomendado que as rondas sanitárias ocorram pelo menos duas vezes ao dia e que elas sejam mais criteriosas, estimulando os animais a levantarem e caminhar, a fim de perceber sinais, como cansaço, relutância em caminhar, tosse, espirros, lacrimejamento, corrimento nasal e “olhos fundos”, que é um importante indicativo de desidratação”, adverte.
Quando a intervenção para o tratamento da doença não é rápida e eficaz, o quadro progride com agilidade e o animal vai à óbito em poucos dias. O combate rápido e por período adequado do processo inflamatório pulmonar é essencial para a recuperação dos animais acometidos, sendo tão importante quanto o controle eficaz dos agentes infecciosos.
“A utilização do meloxicam (anti-inflamatório não esteroidal) junto ao florfenicol (antibiótico de amplo espectro sobre os principais agentes bacterianos envolvidos na DRB), em formulação que permita rápido início e controle duradouro da infecção e da inflamação, é primordial para a regressão do quadro e o retorno do animal ao seu estado de saúde adequado”, orienta o veterinário.
A prevenção da doença pode ser feita por meio de vacinações contra os principais agentes virais e bacterianos das doenças respiratórias dos bovinos. É possível também realizar um protocolo de metafilaxia, com a utilização de um antimicrobiano eficaz sobre os principais agentes bacterianos da DRB e que promovam proteção antimicrobiana por período prolongado (12 dias ou mais).
O procedimento pode ser empregado em conjunto com a utilização de vacinas inativadas contra a DRB. Essa estratégia permite o tempo necessário para a produção de anticorpos estimulada pela vacinação, que não é imediata, enquanto a metafilaxia estiver atuando.
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Clostridioses
O termo Clostridioses engloba várias enfermidades causadas por toxinas ou venenos produzidos por bactérias pertencentes ao gênero Clostridium que se multiplicam no organismo ou mesmo em alimentos e na água que podem ser fornecidos aos animais.
Dentre as mais comuns estão o botulismo, as enterotoxemias, a gangrena gasosa e o carbúnculo sintomático (manqueira). “Também não podemos descartar a morte súbita por clostrídios, um quadro de evolução rápida e relacionado a quantidade de toxina produzida ou ingerida pelos animais acometidos”, complementa Malacco.
O profissional alerta que as Clostridioses promovem grandes perdas econômicas para o pecuarista, uma vez que os agentes responsáveis por elas se encontram no ambiente sob formas bastante resistentes, chamadas esporos, capazes de sobreviver por anos. Os animais ingerem os esporos que, uma vez no organismo, aguardam a condições adequadas para a sua multiplicação, em especial a queda ou ausência de oxigênio (anaerobiose).
No caso do botulismo, Malacco informa que os esporos do C. botulinum se multiplicam mesmo fora do organismo dos animais, produzindo as toxinas que podem ser ingeridas diretamente e promoverem a doença. Uma característica importante das Clostridioses é o rápido desenvolvimento e, em muitas situações, nem mesmo é possível observar animais com sinais clínicos, com a morte ocorrendo rapidamente. Por isso, a maioria das tentativas de tratamento são infrutíferas, além de apresentarem custos elevados.

O manejo não agressivo, especialmente na chegada e processamento dos animais, é uma das ações pode prevenir casos de clostridioses no confinamento: Foto: Divulgação
Como citado, o botulismo é provocado pela ingestão das toxinas botulínicas já formadas pelo Clostridium botulinum, que aqui no Brasil tem os tipos C e D como os principais agentes causadores da doença para os bovinos. A doença é caracterizada por paralisia progressiva dos membros posteriores e anteriores, dificuldade respiratória e paralisia da mastigação e deglutição. Com a progressão da doença, há comprometimento dos músculos respiratórios e morte.
As enterotoxemias estão relacionadas à infecção intestinal aguda não contagiosa causada pela produção de toxinas do Clostridium perfringens, quando em multiplicação. Essa bactéria é habitante normal do intestino delgado dos ruminantes. O desequilíbrio da microbiota intestinal promovido pela troca repentina de dieta ou dieta mal balanceada favorece a proliferação de C. perfringens e a produção de toxinas. Os animais afetados apresentam diarreia (sanguinolenta ou não), desidratação, dor abdominal (cólica), andar cambaleante (ataxia) e morte (quase sempre de forma súbita).
Já o carbúnculo sintomático e a gangrena gasosa afetam a musculatura e o tecido subcutâneo dos animais. Da mesma forma que as clostridioses anteriores, a produção de grande quantidade de toxinas é responsável pelos sinais clínicos apresentados. No caso do carbúnculo sintomático, a condição predisponente para a multiplicação do agente, o Clostridium chauvoei, é a inflamação da musculatura determinada por contusões que podem ocorrer durante o manejo ou mesmo disputas entre os animais.
Em relação à gangrena gasosa, os agentes são encontrados no ambiente e, por consequência, na pele dos animais, sendo introduzidos ao tecido subcutâneo e musculatura através de ferimentos, cirurgias ou introdução de agulhas contaminadas.
Segundo o especialista, algumas ações podem prevenir casos de clostridioses no confinamento, como a adaptação progressiva da dieta, além de adoção de medidas higiênico-sanitárias mais rigorosas eum manejo não agressivo, especialmente na chegada e processamento dos animais. Além disso, vacinações com vacinas polivalentes eficazes e que protejam contra as principais clostridioses, como o carbúnculo sintomático, a gangrena gasosa, as en terotoxemias e o botulismo, são de fundamental importância.
Um outro ponto destacado pelo profissional, é a realização da primovacinação dos animais sem histórico conhecido de vacinações. “É importante destacar que algumas valências dessas vacinas são controladas pelo MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), como é o caso do carbúnculo sintomático, botulismo e enterotoxemias. O controle das outras valências fica a cargo de cada laboratório proprietário da vacina”, finaliza Malacco.