Apesar do temor de recessão global e da postergação de 90 dias nas tarifas anunciadas pelo presidente dos EUA, Donald Trump, o agronegócio brasileiro encontra uma janela de oportunidade. (Foto: Oficial Casa Branca)
A nova escalada da guerra comercial promovida por Donald Trump, que impôs tarifas adicionais de 10% sobre todos os produtos importados do Brasil em abril de 2025, reacendeu preocupações no mercado global e afetou diretamente o agronegócio brasileiro.
No entanto, em meio à turbulência, surgem também oportunidades para o Brasil fortalecer sua posição como um dos principais fornecedores globais de alimentos e commodities agrícolas.
Pecuária: exportações em alta, mesmo com incertezas
Na pecuária, o Brasil tem conseguido manter ritmo forte nas exportações, com números recordes.
“Nos últimos meses, mais de 30% da produção foi enviada ao exterior. As exportações de 2024 acumularam 2,55 milhões de toneladas, um aumento de 27% em relação a 2023”, afirma Larissa Barboza Alvarez, analista da StoneX.
Segundo ela, apesar das investigações chinesas sobre importações de carne e do cenário de guerra tarifária, as vendas seguem robustas. Os EUA, por exemplo, mais que dobraram suas compras de carne brasileira em relação ao ano anterior.
Alvarez também destaca a relevância do Brasil como principal abastecedor da China e terceiro maior dos EUA, o que pode manter as exportações fortalecidas, mesmo diante de tensões comerciais.
Soja: redirecionamento dos fluxos globais favorece o Brasil
A soja brasileira aparece como uma das principais beneficiadas da guerra tarifária, sobretudo com as tarifas impostas pela China sobre produtos norte-americanos.
Ana Luiza Lodi, especialista da StoneX, aponta: “a soja brasileira pode ter sua demanda reforçada, destacando que o Brasil já exporta mais de 100 milhões de toneladas, considerando todos os destinos, em anos de safra favorável”.
Lodi acrescenta que os preços em Chicago devem ser pressionados pela menor demanda chinesa pela soja americana, enquanto os prêmios brasileiros se fortalecem, mesmo em um momento de aumento da oferta, com a colheita no fim.
Milho: impacto moderado, mas com riscos
No caso do milho, os efeitos diretos da guerra tarifária são mais limitados, já que grande parte da produção americana é destinada ao consumo interno.
No entanto, Raphael Bulascoschi, da StoneX, observa que “as incertezas quanto à competitividade do milho norte-americano se ampliam em um contexto de política tarifária mais ativa”, o que pode influenciar os preços, especialmente se houver problemas nas safras do Brasil ou dos EUA.
Etanol: tarifas podem ser compensadas por vantagens ambientais
Com a nova tarifa dos EUA elevando de 2,5% para 12,5% a alíquota sobre o etanol brasileiro, o setor acendeu o alerta.
Ainda assim, Marcelo Di Bonifacio Filho, analista da StoneX, afirma que “o álcool brasileiro produzido a partir da cana possui menor intensidade de carbono em comparação ao etanol de milho americano”, o que mantém sua atratividade em programas de biocombustíveis.
Além disso, o aumento da mistura de etanol anidro na gasolina brasileira pode compensar a possível perda de competitividade nos EUA, e outros mercados seguem como potenciais destinos para o biocombustível nacional.
Suco de laranja: alerta vermelho
Para o suco de laranja, as perspectivas são menos otimistas. A tarifa de 10% imposta pelos EUA, principal destino das exportações brasileiras do produto, tende a aumentar os preços ao consumidor e reduzir a demanda.
Segundo análise da Consultoria Itaú BBA, “a implementação da tarifa de 10%, somado aos atuais USD 415/t, teria efeito inflacionário ao consumidor americano e prejudicaria ainda mais a demanda pelo produto brasileiro”.
O Brasil, que representa 70% das importações americanas de suco, deve buscar alternativas na União Europeia e em países como China e Japão, embora a substituição do mercado americano seja desafiadora.
Algodão: possível redirecionamento das exportações
O algodão também pode se beneficiar indiretamente da disputa entre EUA e China. O país asiático, que importou 760 mil toneladas de algodão americano em 2024, pode recorrer ao Brasil como alternativa. A safra recorde prevista para 2024/25, com aumento da área plantada, pode garantir a oferta necessária para suprir uma eventual redução das compras chinesas dos EUA.
Fertilizantes: cenário desafiador e incertezas globais
No mercado de fertilizantes, as medidas protecionistas dos Estados Unidos e as retaliações da China acrescentam um componente extra de imprevisibilidade.
De acordo com Tomás Rigoletto Pernías, analista de inteligência de mercado da StoneX, “práticas protecionistas do país norte-americano podem impactar o fluxo comercial e os preços de grãos e de fertilizantes, produzindo efeitos que ainda são desconhecidos para o mercado”.
Pernías destaca que a consolidação de uma tendência baixista nos preços enfrenta dificuldades, principalmente devido à demanda firme por cloreto de potássio e à oferta limitada de fosfatados. Além disso, o aumento dos preços do enxofre e a instabilidade na demanda indiana agravam a volatilidade do setor.
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Apesar do temor de recessão global e da postergação de 90 dias nas tarifas anunciadas pelos EUA, o agronegócio brasileiro encontra uma janela de oportunidade.
Segundo a Consultoria Itaú BBA, “os desdobramentos do tarifaço para o agronegócio brasileiro, com as informações até meados de abr/25, nos parecem, no agregado, positivos”, desde que as tensões entre EUA, China e União Europeia não se agravem e levem o mundo a um cenário de baixo crescimento.
A depender dos termos de um eventual novo acordo comercial, o Brasil pode ampliar sua competitividade em setores estratégicos e estreitar laços com países como México, Coreia do Sul e China, fortalecendo ainda mais sua presença no comércio agrícola internacional.