Nova regulamentação deve impulsionar o uso de produtos biológicos, tornar a agricultura mais sustentável e favorecer o setor agropecuário nacional
O Brasil tem condições de se tornar uma potência global na produção de bioinsumos. Entre os motivos que contribuem para isso estão a grande variedade de solos aptos para a agricultura – cada um com as suas próprias técnicas de manejo – a forte tradição do país em adotar novas tecnologias agrícolas e o enorme mercado nacional, que pode triplicar de tamanho até 2032.
Marcelo Picoli, pós-doutor em Patologia Vegetal pela Universidade Estadual de Iowa (EUA) e coordenador do curso de Agronomia do Centro Universitário Integrado, em Campo Mourão (PR), destaca que, com a regulamentação da Lei 15.070/2024, ou Lei de Bioinsumos, agora existe segurança jurídica, normatização para produzir, importar, exportar, comercializar e usar esses produtos biológicos no Brasil.
“É uma grande conquista para todo o setor agropecuário”, destaca.
A nova lei se aplica a todos os sistemas de cultivo, incluindo o convencional, o orgânico e o de base agroecológica.
A regulamentação dispõe sobre o registro, o uso, a inspeção, a fiscalização, a pesquisa, a experimentação, a embalagem, a rotulagem, a propaganda, o transporte, o armazenamento, as taxas, a prestação de serviços, a destinação de resíduos e embalagens e os incentivos à produção para uso agrícola, pecuário, aquícola e florestal, inclusive sobre a produção com objetivo de uso próprio.

Os produtos biológicos contribuem para formar uma agricultura mais sustentável e reduzir o uso de fertilizantes químicos e defensivos agrícolas sintéticos Foto Gustavo Porpino/Embrapa/Divulgação
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Números expressivos
De acordo com estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da CropLife Brasil, o mercado de bioinsumos no país tem crescido a uma média anual de 21%, superando os R$ 5 bilhões na safra de 2023/2024.
Globalmente, projeta-se que esse mercado continuará a crescer entre 13% e 14% ao ano até 2032, alcançando cerca de US$ 45 bilhões, o que corresponde a três vezes o valor atual.
A área tratada com bioinsumos no Brasil também cresceu: passou de 164 milhões de hectares na safra 2021/2022 para 245 milhões na de 2023/2024. O uso é feito em commodities de larga escala como soja, milho, cana-de-açúcar e algodão. Em outros países, o maior uso se dá em culturas do tipo hortifruti, de menor escala.
Presente em todas as regiões, a utilização é mais intensa em Mato Grosso (33%), Goiás (13%), Distrito Federal (13%), São Paulo (9%), Paraná (8%), Mato Grosso do Sul (8%), Minas Gerais (8%).

O uso de bioinsumos na produção de cana-de-açúcar elevou a produtividade da cultura em até 20%, graças às bactérias que aumentaram a absorção de fósforo pelas plantas e da melhoria das condições da terra Foto Maria Gorete Braga dos Santos/Embrapa/Divulgação
O que são os bioinsumos?
Também conhecidos como produtos biológicos, são insumos agrícolas desenvolvidos a partir do uso de um ingrediente ativo de origem vegetal, animal ou microbiológica (bactérias, fungos e vírus) ou estruturalmente similares e funcionalmente idênticas aos de origem natural.
O uso é indicado para prevenir, reduzir ou erradicar a infestação de pragas e doenças nas plantações ou ainda estimular processos fisiológicos da planta. Com baixa toxicidade, os bioinsumos podem promover uma nova revolução no campo reconhecida como ‘agricultura verde ou sustentável’.
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Para que servem
João Rafael de Alencar, doutor em Agronomia e professor do Centro Universitário Integrado, ressalta que, além de proteger as lavouras, eles melhoram a qualidade do solo com a retenção de nutrientes e materiais orgânicos, têm menos impacto sobre a fauna e a flora e ajudam a preservar os recursos hídricos; pois são feitos com materiais biológicos.
“Os bioinsumos contribuem para formar uma agricultura mais sustentável e reduzir o uso de fertilizantes químicos e defensivos agrícolas sintéticos”, completa o especialista.
Mais produtividade
Com o solo mais bem cuidado, a produtividade também aumenta. Um estudo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) mostrou que o uso de bioinsumos na produção de cana-de-açúcar elevou a produtividade da cultura em até 20%, graças às bactérias que foram capazes de aumentar a absorção de fósforo pelas plantas e da melhoria das condições da terra.

Milho é uma das commodities em larga escala que mais utiliza dos produtos biológicos Foto Freepik/Divulgação
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Reconhecimento legal
Mais um ganho da nova lei é o reconhecimento desses produtos biológicos como bioinsumos, pois até então eles não tinham uma classificação específica. A partir de agora os biofertilizantes, biodefensivos, inoculantes, biofungicidas e bionematicidas estão regulamentados por uma categoria e não são mais regulados pela lei de agrotóxicos.
Outro avanço está na racionalização do processo de registro, que ficará sob a competência exclusiva do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Antes, também era necessário ter o aval da Anvisa e do Ibama. A partir de agora, esses dois órgãos só deverão se manifestar quando se tratar do registro de produtos novos para controle fitossanitário.
Benefícios aos pequenos produtores
Marcelo Picoli completa ainda que, de acordo com a nova lei, está autorizada a produção de bioinsumo para uso próprio individual ou na forma de associação de produtores ou cooperativas, produção integrada, consórcio rural, condomínio agrário ou congêneres – mediante um cadastramento simplificado da unidade produtiva, com a necessidade de um responsável técnico – e fica vedada a comercialização.
“Isso vai facilitar o acesso e o desenvolvimento, vai diminuir o uso e o impacto de produtos sintéticos, reduzindo também os custos para os agricultores, especialmente os de pequeno e médio portes”, salienta o profissional.
Fonte: Centro Universitário Integrado, em Campo Mourão (PR)
Foto abertura: Paulo Roberto Pereira – EMBRAPA/Divulgação