Fornecer sombra artificial no confinamento bovino melhora bem-estar animal e impacta positivamente desempenho ambiental
O sombreamento artificial no sistema de confinamento de bovinos de corte pode reduzir as pegadas hídricas e da terra, além de aumentar a eficiência nutricional, revelou um estudo da Embrapa Pecuária Sudeste, de São Carlos-SP.
“Em média, as pegadas hídrica e terrestre foram 3% e 7% menores, respectivamente, nas áreas com sombra em comparação com as instalações a pleno sol”, afirma o pesquisador Júlio Palhares.
Ele conta que foram avaliados três indicadores: pegada hídrica, pegada de uso da terra e eficiência do uso dos nutrientes nitrogênio (N) e fósforo (P) em diferentes cenários agrícolas. No da soja no Paraná e em São Paulo, e primeira e segunda safras de milho, também nesses dois Estados. “A avaliação é pioneira em relação ao impacto de um sistema de confinamento bovino, considerando de maneira holística as eficiências de água, terra e nutrientes e as sinergias entre os três indicadores”, salienta.
Gestão responsável e utilização de tecnologias
Palhares destaca que o impacto das mudanças climáticas, com aumento de temperatura e de eventos climáticos extremos mais frequentes, terá consequências também no desempenho da peculiaridade do corte. “A repercussão dessas especificações climáticas nos bovinos se estende ao consumo de alimentos, padrões comportamentais, uso de água e eficiência para converter nutrientes em carne. Por isso, é importante uma gestão responsável e utilização de tecnologias para mitigar esses efeitos e melhorar a gestão ambiental”.
Bem-estar animal impacta desempenho ambiental
A pesquisadora da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo – USP, Taisla Novelli ressalta que tecnologias que reduzem o estresse térmico e proporcionam mais conforto climático aos bovinos devem ser consideradas para aumentar a eficiência no uso de recursos pela pecuária de corte. “O estudo da Embrapa indicou que fornecer sombra artificial, além de melhorar o bem-estar animal, impacta diretamente o desempenho ambiental”.
O experimento
Participaram da pesquisa 48 touros da raça Nelore, divididos em dois grupos, um com sombra e outro a pleno sol e o material utilizado para oferecer sombra foi uma malha de alumínio termorreflexiva. “Segundo as especificações do fabricante, 78% a 83% de sombra e 32% de transmissão de luz difusa”, diz o pesquisador da Embrapa Sudeste.
Palhares conta que os animais foram separados em quatro áreas com 12 touros cada, por 85 dias. “Os primeiros 11 foram para adaptação, seguidas das fases de crescimento e terminação”.
Ele informa que a dieta foi composta por bagaço de cana, soja, milho e mistura mineral, com valores baseados em matéria seca. Para medir o consumo de ração e água, foram utilizados cochos eletrônicos e bebedouros eletrônicos.
Pegada hídrica
O pesquisador da Embrapa frisa que o projeto para a pegada hídrica leva em consideração a água consumida na produção de alimentos (água verde) e a consumida pelos animais (água azul).
“Para o projeto da água verde foram considerados oito cenários, envolvendo duas cidades, Pradópolis (SP) e Maringá (PR), e quatro sequências de culturas. As pegadas hídricas da soja e do milho foram calculadas para ambos os municípios. No caso do milho, em duas sequências de culturas, a primeira safra e segunda safras”, destaca.
Uso de nutrientes e pegada de uso da terra
Palhares sublinha ainda que, em relação ao balanço parcial de nutrientes no sistema de produção, foi avaliado para nitrogênio (N) e fósforo (P) e calculada a eficiência de uso desses minerais.
Já a pegada de uso da terra, de acordo com o especialista, foi calculada como a razão entre a área de terreno (metros quadrados) necessária para produzir a ração e as produtividades das culturas.
Resultados
- Sombreamento artificial
O pesquisador acentua que os estudos da Embrapa Sudeste mostraram que o sombreamento artificial impede a pegada hídrica e o uso da terra e, também, melhora a eficiência do uso de nutrientes. “A localização da produção de grãos e o período de plantio do milho também influenciaram os valores”, sublinha.
Ele ressalta ainda que, para ambos os tratamentos, o cenário de cultivo com soja e milho primeira safra, produzida em Maringá, revelou menores valores de pegada hídrica e pegada de uso da terra. “Os animais sem acesso à área sombreada tiveram um consumo médio de água azul superior aos com acesso à sombra”, afirma.
- Experimento a pleno Sol
Palhares destaca também que no experimento a pleno sol, o cenário de soja e primeira safra de milho, em Maringá (PR), apresentou menor pegada hídrica – 917 litros por quilo de peso vivo.” Por outro lado, a segunda safra de soja e milho em Pradópolis (SP), expressou uma pegada de 1.676 litros por quilo de peso vivo”, diz.
Segundo o especialista, em ambos os tratamentos, o cenário de cultivo com soja e primeira safra de milho produzida em Maringá aconteceu menor consumo de água verde. “No tratamento sem sombra, o consumo médio foi de 532 m3 e o que não havia sombra, a média foi de 526 m3”.
Já o cenário soja e milho segunda safra, em Pradópolis (SP), apresentou, de acordo com o pesquisador, o maior consumo de água verde em ambos os tratamentos, com média de 976 m3 no sem sombra e 964 m3 no com sombra.
“O consumo médio total de água pelos animais durante o ciclo produtivo a pleno sol foi de 3.252 litros, 8% maior que no tratamento com sombreamento, em que a média foi de 2.983 litros. O consumo médio diário de água por animal (sem sombra) foi de 40 litros ao dia, enquanto no com acesso à sombra, foi de 36,8 litros”, revela Palhares.
Outra informação obtida com o estudo da Embrapa Pecuária Oeste é que, a pleno sol, a eficiência no uso de nitrogênio foi de 15,2% e, em relação ao fósforo, a efetividade média chegou a 35,4%.
- Pegada de uso da terra
Palhares informa ainda que a pesquisa identificou, que, no tocante à pegada de uso da terra, em todos os cenários de cultivo utilizando milho primeira safra, houve exigência de áreas menores em comparação com outros cenários. “Isso significa que as dietas baseadas nesse grão (primeira safra) têm uma pegada terrestre menor. O motivo é, principalmente, a produtividade da primeira safra de milho, que foi 50% maior em Maringá e 29% maior em Pradópolis. Independentemente do município, a utilização do milho de segunda safra resultou em maior necessidade de terras para produção da dieta dos animais”, explica o especialista.
Ele pontua que os animais com acesso à sombra e seguindo o melhor cenário, causaram uma redução de 7% na pegada de uso da terra, em comparação aos animais sem sombreamento com o mesmo cenário de cultivo.
“Os animais que tiveram acesso à sombra demonstraram melhores eficiências de água, nutrientes e terra em relação aos animais em pleno sol. Em média, as pegadas hídricas e terrestres no tratamento com sombra foram 3% e 7% menores, respectivamente, do que no sem sombreamento”, frisa.
Na opinião do especialista, esses resultados indicam que proporcionar práticas de bem-estar, além de promover melhor conforto térmico aos animais, resultam em impactos ambientais positivos em termos de uso eficiente de recursos naturais e insumos.
Métrica complexa
Sérgio Raposo Medeiros, pesquisador da Embrapa, a eficiência da pecuária é uma métrica complexa que depende de vários fatores, sendo o tipo e a formulação da dieta um dos aspectos principais. “Uma dieta ajustada para cada fase do desenvolvimento do animal, pode levar ao melhor aproveitamento dos elementos da alimentação, resultando em menor excedente”, sublinha.
Medeiros orienta que a utilização eficiente da ração não só melhora a circulação de nutrientes, como também reduz perdas para o meio ambiente e custos.
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
Júlio Palhares, da Embrapa Pecuária Oeste, salienta que a pesquisa ainda contribui para o avanço de diversas metas no Brasil dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) para a Agenda 2030.
“O Objetivo 2”, por exemplo, refere-se à promoção da agricultura sustentável de produção de alimentos, com práticas agropecuárias resilientes, manutenção dos ecossistemas, fortalecimento da capacidade de adaptação às mudanças climáticas, às condições ambientais extremas, secas etc”, informa o pesquisador.
Ele acrescenta que “a meta 12, tem relação ao consumo e produção responsável, principalmente em relação à gestão sustentável e ao uso eficiente dos recursos naturais, como a economia de água, de terra e de nutrientes, como propõe o estudo”.
Já o Objetivo 13, de combate às mudanças climáticas, de acordo com o especialista, “busca a adoção de medidas para desacelerar as consequências adversárias da crise climática”, conclui.
Fonte: Embrapa Pecuária Sudeste