Trocar Nova York pela bucólica cidade de Itaipava, na região serrana do Rio de Janeiro, pode não ser para muitos. Mas foi o que fez Rosane Nagib, executiva da área comercial, depois de trabalhar por 10 anos naquela metrópole. Devido à mudança da sede da empresa, em 2005, Rosane não quis buscar uma vida contemplativa, pelo contrário. Ao lançar sua própria empresa, a integrante do OrganicsNet Rudá Alimentos, ela trouxe a agitação e a disposição da cidade grande para uma nova perspectiva de trabalho, como conta a empresária à Lavoura.
Já instalada em Itaipava, Rosane Nagib manteve-se ativa ao começar a fazer bolos artesanais, usando sabores diversificados, componentes integrais e/ou orgânicos. Logo alcançou boa receptividade de quem os provava, tanto que conseguiu realizar sua primeira venda em setembro de 2006. Mesmo sem escala de produção, já em novembro daquele ano a então chamada Rudá Brasil Alimentos participou da feira Petrópolis Gourmet. Sob a orientação do Sebrae/RJ, Rosane buscou a certificação Abio. Após cumprir os processos de ajuste, a certificação saiu em fevereiro de 2007, bem a tempo da primeira comercialização.
A empresária conta que sua entrada no setor orgânico não foi planejada inicialmente, mas viu que era uma oportunidade por ter trabalhado antes com ingredientes desta natureza. Em 2010, antevendo uma possibilidade de trabalhar também com produtos naturais, alterou o nome da empresa para “Rudá Alimentos”. Contudo, para embarcar nessa nova vertente, a empresária sabe que precisará de sócios para dividir as muitas – e normalmente exaustivas – tarefas dentro da empresa.
Rosane Nagib destaca que o empreendedor deve sempre aprimorar seus conhecimentos, buscando outros produtores, visitas a fábricas já ativas ou mesmo contratando consultorias. “Acredito que minha formação comercial foi importante para o desenvolvimento da empresa, mas de qualquer forma ainda tive que aprender muitos detalhes específicos sobre o setor de alimentação”, alerta a proprietária da Rudá.
O volume atual de produção de sua fábrica em Itatiaia, inaugurada em janeiro de 2010, está em 1500 bolos por mês e 4000 pães-de-mel de dois sabores por semana. Além desses, a Rudá produz biscoitos doces e salgados e “stolen”, uma espécie de pão com receita alemã. A fábrica foi remodelada em seus sistemas de produção, organizando melhor o trajeto das matérias-primas.
Mesmo a circulação dos funcionários foi alterada, separando os encarregados das áreas quentes, refrigeradas, de componentes crus e de estoque pronto para entrega.
Inovação na formulação de receitas
Rosane Nagib conta que as receitas de seus produtos, além do laboratório, passam sempre por ela. “Fico imaginando quais sabores podem combinar”, revela a empresária, algo que já fazia desde a produção artesanal. Nagib tem a percepção de que inovar em formulações e matérias-primas é um diferencial importante do mercado, que costuma reagir bem a novidades.
Algo mais difícil de enfrentar é a sazonalidade. Como os produtores e donas de casa já sabem, ela influencia em muito a produção – e principalmente o preço – de qualquer alimento. As frutas são bastante atingidas; uma saída, para as que podem ter sua polpa extraída, é o congelamento. Já com alguns legumes, como a abobrinha – que compõe o sabor principal de um bolo – é preciso pagar o preço mais alto para não interromper a produção. Mesmo assim, Rosane conta que foi obrigada a fazer alterações na composição no bolo por um fator completamente diverso: na concentração normal, o alto teor de umidade do legume estava provocando mofo nas amostras testadas. A saída foi diminuir tal componente, alcançando assim uma boa durabilidade.
Já para os processos da fábrica, Rosane estabeleceu dias de produção específicos, de acordo com a formulação dos produtos e da logística de entrega para seus pedidos. Quanto aos outros componentes dos produtos, eles exigem o chamado “jogo de cintura” do empreendedor.
Rosane mandava trazer abóboras orgânicas da região Sul, mas conseguiu um fornecedor de Juiz de Fora e de Teresópolis. Obviamente, para baixar seus custos e melhorar tal logística, ela está negociando para fechar com produtores do Brejal, do mesmo município do estado do Rio.
Assim, de novo aparece o obstáculo exaustivamente apontado pelos empreendedores do Brasil: é a distribuição e logística de entrega. “Já tive até mercadorias que ‘sumiram’ durante o transporte. É um setor deficiente. Em breve terei que procurar empresas de entrega, mas não são muitas para escolher; é algo que me preocupa”, revela a empresária. Enquanto isso, faz entrega para supermercados e lojas do pequeno varejo.
Consultoria do Sebrae
“Tenho encomendas maiores dos primeiros, mas não quero depender só deles”, planeja Rosane, contando com uma consultoria do Sebrae nacional na questão de mercado. Sua intenção agora é buscar um representante para distribuir melhor os produtos da Rudá no Rio e São Paulo. Como proprietária de uma pequena empresa, Rosane tem que se desdobrar em quase todas as funções, administrativas ou não. Tanto é que, durante a entrevista, foi consultada algumas vezes sobre o processo de produção dos bolos.
“Como vim do mundo empresarial, seria ótimo usar minha experiência apenas para coordenar e divulgar, por exemplo. Mas, pelo menos por enquanto, não tenho pessoal para delegar funções. Então tenho que assumir e realizar tudo, na medida do possível”, lamenta a proprietária.
Ela conta também que teve boas vendas em 2009, mas ela e outros empresários de orgânicos enfrentaram sérias dificuldades em 2010. “Este ano começou tragicamente, com os reflexos das enchentes no Rio de Janeiro. Pareceu-me até que as pessoas saíram menos de casa, temendo não serem pegas de surpresa – o que se refletiu nas baixas vendas,” especula. “Depois, veio a Copa, que manteve meu mercado ruim. Não houve nem a recuperação normal das férias; aqui em Itaipava, grande parte do público comprador de orgânicos é de classe mais alta. Com o dólar em baixa, eles preferiram viajar para fora do Brasil em vez de vir à região serrana.”
OrganicsNet: divulgação eficiente em eventos
Uma ferramenta em que Rosane gostaria de investir seria material de divulgação, mas a Rudá ainda não pode arcar sozinha com seu alto custo. Por isso, aproveitou as oportunidades que surgiram junto ao Organics-Net, participando de feiras, eventos e encontros no Rio de Janeiro. Ela avalia que ainda falta mais divulgação para o público do que é o setor e seus produtos, embora tenha observado um impulso no governo Lula, com pessoas mais simples começando a conhecê-los.
“Acho que é uma questão de educação que cabe às autoridades, incentivando o consumo de orgânicos. Porque se esses produtos chegassem a um volume de produção igual aos convencionais, o preço dos últimos só seria de 20 a 30% menor”, revela Rosane. Já na questão de custos, outras decisões legais são criticadas pela empresária: “a Secretaria da Fazenda agora exigirá que as empresas, para emitir suas notas de venda, tenham impressora fiscal. Também serei obrigada a ter uma máquina de ponto eletrônico. Ambos equipamentos somam mais de R$ 2.000; para uma empresa de pequeno porte, é um custo muito pesado, preocupante.”
Mas o ano de 2010 não teve somente notícias negativas. A volta às aulas do segundo semestre geralmente é benéfica aos produtores de alimentos, pois gera mais vendas. Agora, vai investir em pães, que têm maior margem de lucro – sem deixar a consciência de orgânico.
Certificação
“Minha certificação é ABIO, com inspeção e renovação anuais. O custo assim fica menos pesado, mas são analisadas as formulações de todos os produtos, processos e instalações”, informa, destacando também a ajuda do OrganicsNet, que favoreceu a parceria com a Embrapa. Durante quatro meses, a Rudá pôde contar com a consultoria da última para aprimorar formulações e estudos de embalagens.
Além disso, a empresária vem preparando quatro novos produtos para serem lançados na Biofach América Latina deste ano, em São Paulo. Animada, ela observa que os clientes pedem novidades, e a inovação demonstra que a empresa está atenta às demandas do mercado.