A cevada é um mercado específico e a área de cultivo está em expansão
A semeadura da cevada começa em maio e vai até julho no Brasil. Após redução de área de cultivo no começo dos anos 2000, chegando a 77,5 mil hectares na safra 2009/2010, a cultura da cevada voltou a crescer.
A estimativa de área para a nova safra é de superar os 104 mil hectares da safra passada. A principal dificuldade para manter a área tem sido a competição com o mercado internacional, principalmente com importações do Mercosul e, internamente, com outras espécies como trigo e aveia no Sul, ou feijão e milho irrigado no Sudeste e Centro-Oeste, que disputam as oscilações do mercado a cada novo ano agrícola. Além disso, há a necessidade de cumprimento das exigências de produção de grãos com qualidade cervejeira, principal mercado da cevada no país.
Ainda assim, nos últimos dez anos (2003-2012), a produção apresentou taxa de crescimento de 1,8% ao ano, fruto do aumento constante do rendimento nas lavouras (acréscimo médio de 43,9 kg/ha/ano nesse período) pelo uso de novas cultivares, associado ao emprego de melhores práticas de manejo. Na safra 2011/12, por exemplo, o rendimento médio brasileiro registrou um recorde de 3.451 kg/ha.
Produção concentrada
No Brasil, a produção de cevada está concentrada na região Sul (PR, SC e RS com 97% da área), onde o sistema de cultivo de sequeiro é tradicional, envolvendo mais de 1.300 propriedades, com áreas que variam de um a 700 ha/propriedade.
O principal concorrente da cevada é o trigo, tanto pela tradição no cultivo, quanto pela maior tolerância a solos ácidos e de baixa fertilidade, além da menor suscetibilidade a algumas doenças. Contudo, a cevada apresenta como vantagens: ciclo mais curto, entrando primeiro e saindo entre uma e duas semanas antes que o trigo, permitindo antecipar os plantios de verão; resistência a doenças como a ferrugem da folha do trigo; produtividade superior ao trigo na maioria das safras, na mesma região, mantendo uma relação muito próxima nos preços de comercialização; e liquidez de mercado, com a produção contratada antes da semeadura.
Safra atual
Nesta safra, a área de cevada na região Sul deve ocupar 50,8 mil ha no PR, 46,3 mil no RS e 4,5 mil em SC. Em São Paulo, em cultivo irrigado, estima-se a repetição de área de 2.500 ha em 2013. As cultivares indicadas são BRS Cauê, BRS Elis e BRS Brau, da Embrapa Trigo, e as cultivares MN610 e MN 743, da AmBev para a Região Sul; e BRS Sampa e BRS Manduri para São Paulo. As cultivares Embrapa ocupam, em média, 80% da área na Região Sul e 100% da área irrigada.
A partir das pesquisas desenvolvidas pela Embrapa (unidades Trigo e Cerrados), a cultura típica de clima frio ganhou espaço no Centro-oeste e Sudeste do país, com cultivos em sistema irrigado em GO, DF, MG e SP. O estado de Goiás foi pioneiro no cultivo irrigado, chegando a mais de 2.245 ha em 2001, mas o trabalho não teve continuidade em razão do alto custo do frete para escoar a produção até SP ou PR. No caminho inverso, com o fomento da indústria e o lançamento de cultivares adaptadas à região, a cevada em São Paulo passou de 240 ha em 2005 para 2,5 mil em 2012.
Produção paulista
A produção paulista começou em 2004, através da parceria entre pesquisa e indústria de malte para o desenvolvimento de cultivares de rendimento e qualidade industrial competitivos. Assim, já foram registradas as cultivares BRS Sampa, BRS Manduri e BRS Itanema. No cultivo irrigado, a cevada concorre com uma série de culturas que ocupam área de pivô central, principalmente o feijão na estação seca. Em condições de igualdade em potencial de resultados econômicos, a cevada tem como vantagens, além da liquidez, rendimento competitivo com menor quantidade de água e o menor uso de fertilizantes nitrogenados. No sistema de produção, a cevada quebra o ciclo de doenças das leguminosas e, devido à curta dormência dos grãos, pode ser malteada logo após a colheita.
Onde está o mercado consumidor
A cevada tem inúmeras utilidades, além do malte para a indústria cervejeira, e é aplicada na composição de farinhas ou flocos para panificação e derivados, na produção de medicamentos, na formulação de produtos dietéticos e sucedâneos de café. Contudo, o principal mercado da cevada no mundo é a alimentação animal, com 68% da produção mundial utilizados como forrageira e ração para as criações.
No Brasil, devido a alternativas mais vantajosas para os animais, a cevada tem sido fomentada para uso na fabricação de malte para indústria cervejeira e, nesse sentido, o mercado do cereal no país pode ser caracterizado como um mercado especializado, com estreita vinculação entre produtores e indústria, por meio de programas de fomento, assistência técnica e compra garantida, o que requer do produtor atenção para atendimento às exigências do produto final. Na prática, o produtor destina aos animais os grãos que não foram enquadrados pela classificação da indústria para malte, suplementando o rebanho com ração. Para forragem, a cevada produz abundante biomassa e grãos com maior teor de proteínas que o milho.
Nova maltaria
Com o início das operações da nova maltaria da Ambev em Passo Fundo (RS), a indústria nacional de malte demandará este ano cerca de 660 mil toneladas de cevada classificada. Contudo, a produção nacional de 2012 com qualidade para malte não ultrapassou 150 mil toneladas, suprindo apenas um quarto da demanda da indústria, com o restante do abastecimento trazido principalmente da Argentina e do Uruguai. Atualmente, existem quatro maltarias em operação no Brasil: Malteria do Vale (Taubaté/SP), Agromalte-Agrária (Guarapuava/PR), Navegantes-AmBev (Porto Alegre/RS) e Passo Fundo-Ambev (Passo Fundo/RS). Juntas, têm capacidade de produção de malte de 560 mil toneladas, atendendo cerca de 40% do consumo nacional, apenas pela indústria cervejeira que, além das grandes marcas, ainda conta com mais de 200 cervejarias artesanais.
Nos últimos 10 anos, segundo dados da CONAB, a área de cevada teve uma queda de 43%, passando de 154,1 mil ha na safra 2001/02, para 104 mil ha na última safra (2012/13). A redução está vinculada ao preço do produto e à alta exigência nas especificações da matéria-prima para atender à indústria cervejeira. Os preços do mercado interno são definidos pelo preço das importações e os custos de produção no Brasil têm sido maiores quando comparados com outros países do Mercosul. Em 2012, o preço médio pago ao produtor no Paraná foi de R$461,17/tonelada.
No entanto, com a redução da produção mundial em 3% na safra 2012/13, as cotações do cereal começaram em alta em 2013, sendo o preço médio pago ao produtor no Paraná de R$613,23/t, parte pela redução da produção esperada no Rio Grande do Sul (quebra de rendimento e padrão de qualidade) e parte pelo comportamento dos preços externos.
Maior desafio
É preciso reconhecer que o gargalo está no clima. A maior dificuldade dos produtores brasileiros é vencer a chuva e a umidade na maturação dos grãos, que podem causar perdas na germinação. Então, colher a cevada de maneira estável, com os 95% de germinação exigidos pela indústria malteira, é o grande desafio da pesquisa e do produtor nas condições de clima na Região Sul. Mas qual a cultura que não traz risco? Na incerteza climática, o melhor é apostar em mais de uma espécie, como o trigo e a cevada, por exemplo, que não concorrem em épocas de semeadura e de colheita.
Para mais informações sobre o cultivo de cevada no Brasil, consulte o site da Embrapa Trigo em http://www.cnpt.embrapa.br/culturas/cevada/index.htm.
Euclydes Minella – Melhorista de Cevada da Embrapa Trigo e Cláudia de Mori -Pesquisadora de Sócioeconomia da Embrapa Trigo